"I like to move it, move it!, I like to move it, move it!" - foi assim que, num inglês até bastante perceptível, o meu filho Afonso me recebeu à porta, quando regressei a casa do trabalho. Tentei puxar por ele, saber onde tinha aprendido a música, como e porquê, mas ele sorria com aquele sorrisinho malandro que ele tem e repetia a lengalenga musicada, divertido: "I like to move it, move it!"... Ao deitar, já o pequenote Sebastião tentava repetir as palavras desconhecidas, mas novamente a minha curiosidade não foi satisfeita ("Conta lá, Afonso... Foi a tua professora da escola que te cantou? Algum colega?" - Nada. Não me respondeu). Tive que improvisar para conseguir puxar por ele. Trepei para cima da cama dele e dancei o "I like the move it, move it" como o dancei muitas vezes, há alguns anos (para não dizer muitos). Quebrei o corpo todo num break Dance improvisado e quando tornei a olhar para os meus filhos eles estavam especados, sentados no sofá das histórias a olhar para mim com ar incrédulo. "Afinal também conheces a música, mamã..." - disse o Afonso, ainda boquiaberto. Poupei-os às minhas histórias. Havia tanto por dizer sobre o "I like to move it, move it". Mas inverti o jogo e agora era o Afonso a querer saber onde eu tinha aprendido a música, e quando. Em troca, contou-me que tinha sido o amigo Francisco, lá da escola, que tinha passado o dia a cantar aquela música. E a saga terminou com os três a dançar o "I like to movie it, move it" em cima da cama do Afonso que, qualquer dia, à custa de tanta improvisação, ainda vem abaixo...

Frase da semana do Afonso: "Ó mãe, tu e o pai não vão obrigar-me a ir à tropa, pois não? É que eu só quero ir se os meus amigos também forem..."
Há determinadas características nossas que desejamos que os nossos filhos não herdem. Sejam elas doenças, características físicas que não gostamos em nós, ou defeitos. Mas hoje apercebi-me que o meu filho Afonso herdou de mim os pesadelos. Quem me conhece sabe como são mirabolantes as minhas noites, entre guerras, monstros, mortos e feridos. E hoje o meu filho Afonso, com apenas quatro anos, contou-me que as suas noites não são muito diferentes das minhas:
- Porque é que, quando eu fecho os olhos, sonho sempre com coisas más, mamã?
Comecei por lhe dizer para tentar contrariar os sonhos maus, e pensar em coisas boas antes de fechar os olhos.
- Mas eu faço isso, mamã. Penso no arco-íris e tenho pesadelos na mesma.
Acabei por confessar-lhe que comigo acontecia a mesma coisa. Mas que isso significava que tínhamos uma grande imaginação.
- E a minha "imanigação" não pode pensar em coisas boas?
Acabei por ter que usar o consolo que uso para mim mesma, e explicar-lhe que a grande vantagem de sonharmos com coisas más, é que abrimos os olhos e percebemos que aquilo que vivemos é muito bom.
- E não podemos ficar sempre com os olhos abertos?
Não. Claro que não. Támbém já o desejei muitas vezes. Mas a noite vem e os olhos pesam. E os sonhos aparecem. Felizmente que o dia tem muito mais horas do que a noite e nele, com chuva ou sem ela, os dias são quase sempre tão bonitos como o arco-íris!
Depois da minha alcunha de sempre "Biga", e de ser chamada de "Tia Pompom" pela minha sobrinhita emprestada Mi, chegou a vez do meu filho Sebastião me arranjar um nome alternativo:
- Sebastião, sabes o nome da mamã?
- Sim, sei. Mamã Rodrigues Lagarta Fugida...
O meu filho Afonso anda perito em perguntas difíceis:

- Mamã, é verdade que quando as pessoas estão muito, muito apaixonadas, nascem bebés?

- Mamã, é verdade que eu saí pelo teu pipi?

. Mamã, tu deitas sangue do pipi?

- Mamã, é verdade que quando eu for crescido tu já morreste?
- Mamãaaaaaaa! (Afonso a chamar-me do seu quarto, já depois de o ter deitado) Tens que vir cá. Tenho um problema.
Lá fui até ao quarto, a olhar para as dez da noite que batiam no meu relógio, pronta para mais uma desanda ao meu filho mais velho que teimava em não adormecer.
- O que é que foi agora, Afonso?
- É que eu às vezes penso nas coisas e acho que elas existem.
- Que coisas, Afonso?
- Coisas feias, como monstros...
Debrucei-me a ele com um sorriso rasgado.
- Sabes o que é que isso quer dizer? Que tens muita imaginação e podes escrever histórias, como a mamã.
- Mas eu ainda não sei escrever...
- A mamã vai ensinar-te. Agora dorme.
Apaguei pela quinta vez a luz do quarto.
- Mamãaaaaa...
- Diz, Afonso.
- Se calhar em vez de bombeiro, quero ser escritor...
E pronto. O Afonso esta noite já não vai sonhar com monstros... e a mãe também vai dormir muito feliz (e babada!)
Se há frase que assusta os pais de filhos em idades inferiores a seis anos (antes dos “Tive nega”, “Dei o meu primeiro beijo”, “Quero uma mota” ou “Iniciei a minha vida sexual”, já para não ir para coisas mais “graves”) é a do “estás a abrir um precedente”... Cada vez que o meu marido, familiares ou amigos me dizem “estás a abrir um precedente”, é sinal que já fiz asneira, que já cedi quando não devia ter cedido e agora vou ter que sofrer as consequências. Se deixo um dia o meu filho mais novo viajar na cadeira do irmão mais velho, abri um precedente e já sei que na semana seguinte ele vai fazer birras diárias para continuar a viajar na “cadeira proibida”. Se meto um dia a sopa na boca do filho mais velho, vou demorar uma semana a convencê-lo a pegar na colher para comer a sopa sozinho. Se deixo o meu filho mais novo dormir com duas chupetas, vai acordar-me, durante dias, vezes sem conta a meio da noite para me requisitar a segunda. E por aí foa... Tudo tem precedentes, como aqueles cadeirões da Faculdade que tinham nomes horríveis seguidos de I e II e III. Sendo que, na Faculdade, tinha que se fazer o I para se seguir para o II e para o III. Na faculdade dos pais, se cedemos a fazer a cadeira/asneira I, já sabemos que temos que levar com as restantes. Felizmente que, na faculdade dos pais, as cadeiras/consequências não duram semestres. Podem durar apenas dias se os pais se esforçarem e se mostrarem firmes a enfrentar as teimosias dos filhos.
Tudo isto para contar que, há dois dias, abri um precedente (uhhh...). O meu filho mais novo saltou da cama, saiu do seu quarto, e foi enfiar-se na cama do irmão mais velho, que fica no quarto ao lado. Chamaram-me os dois, a rir, muito divertidos, e quando lá cheguei o Afonso (que é o mais velho, para quem ainda não sabe) perguntou: “O Sebastião quer dormir comigo. Pode?”. E – confesso – não resisti. Vi aqueles quatro olhinhos a olharem para mim na penumbra, suplicantes, as mãozinhas dadas, e (pronto!) lá abri o maldito precendente: “Querem muito?”. Não queriam eles outra coisa. O Sebastião (mais novo) aninhou-se logo no irmão, mas o Afonso, porque é mais velho e já vai sabendo que os pais tentam não abrir precedentes deste género, ainda não estava bem a acreditar que aquilo fosse a minha palavra final. “Podemos mesmo?”. A palavra “precedente” começou logo a martelar-me na cabeça, mas a imagem dos meus dois filhinhos de mãos dadas, muito amigos e mais unidos do que nunca, satisfeitíssimos por dormirem pela primeira vez na mesma cama foi mais forte do que qualquer coisa. Ainda me armei em “mãe” e soltei um “Mas se ouvir um pio que seja, levo logo o Sebastião para o quarto dele!”. Mas qual quê! Nem piaram. Desci as escadas com o “precedente” a martelar-me a consciência, e o pai dos dois reizinhos lá soltou a frase penalizadora em voz alta: “Olha que estás a abrir um precedente...”. E o precedente lá estava. No dia seguinte, ainda não tinha acabado de descer as escadas, depois da história, lá ouvi os “tique-tique” dos pezinhos do Sebastião a escaparem-se para a cama do mano. Hoje foi o terceiro dia, ralhei, disse que era só para ocasiões especais, mas ainda vai demorar mais 2 ou 3 dias até voltar tudo ao normal...