Os meus gémeos estão de comer! Com dez mesinhos acabados de fazer, já correm a casa toda nos voadores, chamam "mama" e "papa", a Leonor já usa ganchinho e cada um deles tem dois dentinhos de amostra. Uma ternura! O Duarte é rapazola: mexido, esguio, inquieto. A Leonor é meninha: sossegada, observadora, deixa cortar as unhas e consegue ficar sentadinha a brincar (o irmão atira-se logo para o lado para ir apanhar qualquer coisa). Àparte as diferenças que poderia atribuir aos géneros, são diferentes em quase tudo o resto. O Duarte adormece às 8 e meia da noite e acorda às 8 da manhã. A Leonor adormece às dez e acorda às seis da manhã, altura em que vai fazer companhia ao pai, que é igualmente madrugador. O Duarte gosta de chuchas de silicone. A Leonor de chuchas de borracha. O Duarte gosta dos bicos das tetinas com furos maiores. A Leonor gosta daqueles com furos pequenos. O Duarte ri-se para toda a gente. A Leonor só se ri depois de algum tempo a ganhar-lhe a confiança. O Duarte tem medo de barulhos (varinha mágica e 1, 2, 3). A Leonor fica impávida e serena quando os ouve.
Poderia continuar o role das diferenças, que me leva a perguntar como é que dois seres que passaram nove meses na mesma barriga e são criados da mesma forma pelos pais, podem ser tão diferentes. É a prova provada que, desde pequenos, eles são o que os pais fazem deles, mas também muito aquilo que já são. Que sempre foram. Herdado, muitas vezes, mas combinado de forma a ser único e irrepetível. É, sem dúvida, o milagre da vida.
Ontem resolvi oferecer um diário ao Afonso. Com cadeado e chave, à moda antiga. Fui mostrar-lhe os meus diários e expliquei-lhe que aquilo que eu escrevia não era lido por ninguém. Ou melhor, supostamente, porque a avó Antónia volta e meia quebrava as regras e lá ia espreitar os meus escritos, a tal ponto que cheguei a deixar-lhe recados no próprio diário: "Não leias mais" ou "Se acabaste de ler, peço-te que não voltes a fazê-lo", etc. Enfim, coisas da adolescência. Acontece que o Afonso não é nenhum adolescente. Tem uns míseros seis anos, e anda ainda na descoberta das letras. Mas achei que o facto de ter algo secreto onde pudesse escrever, o aliciaria para a escrita. E a verdade é que funcionou. Hoje de manhã, assim que lhe entreguei o diário e lhe expliquei as regras, fechou-se no quarto e foi escrever a sua primeira frase. O problema foi depois:
- Já acabaste, Afonso? Posso ler?
- Claro que não, mãe! É secreto.
- Ó filho, mas tu só tens seis anos. Não podes ter segredos para a mãe.
- Um diário é privado. Não pode ser lido nem pelos pais.
Para evitar espreitadelas da mãe - semelhantes às da avó Antónia - hoje passou o dia com a chave ao pescoço, dentro de um saco da Kidzania. Lá ia fazendo "pirrassa" e saracoteando-se à nossa frente com o seu diário, e eu e o Sebastião passámos o dia a tentar ler a maldita frase que ele lá tinha escrito. O Sebastião foi menos discreto e conseguiu rapinar-lhe por duas vezes o diário. À primeira foi apanhado pelo irmão e acabou a chorar. À segunda foi apanhado por mim, na casa de banho, a tentar forçar o diário trancado que me tinha custado 15 euros, e acabou a ouvir um raspanete: "Não ouviste o teu irmão? Um diário é secreto!". Mas depois de tudo deitado e o pai também já a dormir, quem não se aguentou fui eu! O dário estava à mão de semear, o saco com a chave também e eu, na calada da noite, acabei por invadir a privacidade do meu filho logo no primeiro dia do seu diário secreto. Que péssima mãe! Pior fiquei ainda quando abri o diário, a roer-me de curiosidade, e li a seguinte frase:

A MAMÃ É BONITA

Mas foi tão feia...